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Aparentemente parece uma contradição: enquanto o índice FipeZap registrou aceleração dos aluguéis em agosto (+0,66% no mês, superando a deflação do IPCA de -0,11%), neste mês de setembro, analistas alertaram sobre a redução de dividendos nos fundos imobiliários (FIIs). À primeira vista, parece estranho que o mercado de locação esteja aquecido enquanto os FIIs sofrem pressão. Mas a realidade é mais nuançada do que aparenta.

O que cada termômetro mede

A chave para entender esse cenário está em reconhecer que estamos falando de métricas completamente diferentes:

O FipeZap mede preços pedidos em anúncios de locação residencial — ou seja, o quanto os proprietários estão pedindo por imóveis que acabaram de entrar no mercado. É uma fotografia das expectativas de quem está ofertando, não necessariamente do que está sendo pago pelos inquilinos já instalados.

Os dividendos de FIIs, por sua vez, refletem o fluxo de caixa efetivo dos fundos, especialmente aqueles com carteiras de CRIs (Certificados de Recebíveis Imobiliários) indexados ao IPCA. Quando o índice oficial vai para terreno negativo, o cupom desses títulos encolhe quase automaticamente.

Defasagens que explicam

A questão do timing é fundamental para entender por que os movimentos podem divergir:

Para o proprietário pessoa física, o repasse da alta dos aluguéis acontece apenas uma vez por ano, no aniversário do contrato, considerando o IPCA ou IGP-M acumulado nos 12 meses anteriores. O -0,11% de agosto impacta essa conta, mas diluído em 12 meses de dados.

Para FIIs de papel, a correção é mensal e chega aos dividendos com cerca de dois meses de defasagem operacional. A deflação de agosto, portanto, deve aparecer nas distribuições de outubro/novembro.

Os números em perspectiva

Vale lembrar que, mesmo com a deflação pontual de agosto, o cenário anual permanece favorável aos locadores:

  • Em 12 meses: aluguéis subiram 10,04% vs. inflação de 5,13%
  • No acumulado de 2025: 6,83% vs. 3,15% do IPCA
  • Rental yield médio: mantém-se em 5,94% ao ano, com algumas capitais como Belém, Recife e Cuiabá superando 8% anuais

Nem todos os FIIs são iguais

É importante destacar que o impacto da deflação não atinge todos os FIIs da mesma forma:

FIIs de papel com CRIs indexados ao IPCA sentem o efeito quase imediatamente (com a defasagem operacional mencionada). São estes que mais preocupam analistas no curto prazo.

FIIs de tijolo, que detêm imóveis físicos, dependem da dinâmica de suas carteiras: vacância, poder de barganha para reajustes e mix de indexadores dos contratos. Para estes, o efeito da deflação pontual é mais diluído e indireto.

A demanda estrutural continua

Por trás da alta persistente nos preços anunciados de locação está uma pressão estrutural de demanda. Segundo dados do IBGE, o número de domicílios alugados cresceu 45,4% em oito anos, criando pressão adicional em mercados líquidos.

Capitais como Brasília (+3,55% em agosto), Teresina (+3,08%) e Belém (+2,10%) lideram as altas, sugerindo que fatores locais específicos também influenciam a dinâmica de preços.

Oportunidades na divergência

Para investidores atentos, essa divergência pode representar oportunidades:

  • Proprietários individuais podem se beneficiar do aquecimento dos aluguéis anunciados, especialmente em mercados específicos
  • FIIs de papel podem estar apresentando momentos de entrada mais atrativa, considerando que a deflação tende a ser pontual
  • FIIs de tijolo com boa governança e contratos diversificados podem resistir melhor à volatilidade dos índices

Conclusão: não há paradoxo

O que parece uma contradição é, na verdade, o funcionamento normal de mercados com dinâmicas distintas. Os aluguéis residenciais seguem a lógica da oferta e demanda, com reajustes anuais e negociações diretas. Os FIIs de papel, por sua vez, operam em um ambiente mais mecânico e indexado, reagindo rapidamente às variações dos índices oficiais.

A lição é clara: o mercado de locação brasileiro é multifacetado, e cada segmento tem suas próprias regras do jogo. Compreender essas diferenças é fundamental para tomar decisões de investimento mais acertadas, seja comprando um imóvel para alugar, seja investindo em fundos imobiliários.

Para quem acompanha o mercado, a recomendação é observar as tendências de médio prazo, não se deixando levar pelas oscilações pontuais de um mês. Afinal, tanto a deflação quanto a aceleração dos aluguéis são fenômenos que precisam ser contextualizados dentro de suas respectivas dinâmicas de mercado.