
A reforma tributária, que começa a valer em 2026, terá um impacto relevante sobre o aluguel de curta duração, segundo advogados tributaristas e representantes do mercado imobiliário. O imbróglio central envolve o fato de o texto legal equiparar, para fins tributários, a locação de imóveis por até 90 dias aos serviços de hotelaria.
Na prática, a mudança altera significativamente a carga tributária de quem disponibiliza imóveis para temporadas por meio de plataformas digitais, como Airbnb e Booking.
Antes, porém, é importante esclarecer que a maioria dos pequenos locadores — pessoas que alugam uma casa na praia ou um imóvel comprado como forma de complementar renda — não será afetada.
Isso porque a incidência dos novos tributos sobre consumo, o IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) e a CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços), que formam o novo IVA, passa a existir apenas acima de um piso de renda anual. Abaixo desse limite, não haverá cobrança.
É importante consultar especialista tributário para entender sua situação específica. Mas neste guia do Portas você conhece as linhas gerais das mudanças.
Quem passa a pagar IVA no aluguel por temporada
Com a reforma, regulamentada pela Lei Complementar 214/2025, passam a ser contribuintes obrigatórios do IBS/CBS:
- Empresas que alugam imóveis;
- Pessoas físicas que atuam como locadores profissionais, ou seja:
- mais de três imóveis;
- renda anual superior a R$ 240 mil com aluguéis; ou
- renda superior a R$ 24 mil em um único mês (R$ 288 mil/ano).
A renda de curta temporada deve ser somada a outras rendas com imóveis para fins de enquadramento.
Segundo o advogado tributarista Daniel Bijos Faidiga, sócio da LBZ Advocacia, o impacto tende a ser expressivo:
“Esse tipo de locação foi equiparado à hotelaria, com uma alíquota elevada. Quando a pessoa aluga diretamente, até pode ocorrer sonegação. Mas plataformas tendem a tornar isso inviável ou muito arriscado. Ou o custo será repassado ao consumidor, encarecendo a estadia, ou haverá menos oferta — o que também pressiona os preços para cima.”
Para o especialista, a lógica da reforma é dar neutralidade concorrencial:
“Se o aluguel de curta duração concorre com hotéis, a tributação deve ser a mesma para o mesmo tipo de serviço.”
Qual é a diferença de alíquota entre aluguel por temporada e hotelaria?
Além da reforma tributária, o Projeto de Lei Complementar 108/2024, aprovado no Senado, reforça a equiparação entre aluguéis de curta duração e hotelaria, inclusive mantendo os mesmos limites de renda. O texto também determina que os R$ 240 mil anuais do exercício anterior devem considerar a receita proveniente da locação por temporada.
Diante desse novo cenário, a LCA Consultoria elaborou um estudo, a pedido do Airbnb, estimando que a carga total para proprietários enquadrados como contribuintes do IVA poderá chegar a 39% da receita — o dobro da alíquota média do setor hoteleiro. E há ainda especialistas que calculam que chegará a 44%.
Para chegar a esse percentual, a LCA somou ao IVA devido pelos proprietários a tributação incidente sobre a renda da pessoa física, o que abre espaço para mudanças de planejamento tributário.
“Algo que pode ocorrer é a profissionalização e a concentração. Locadores com mais controle sobre seus itens de consumo — como serviços e amenities — poderão tomar crédito e oferecer preços menores, especialmente se operarem como pessoa jurídica”, explica Faidiga.
Créditos tributários e profissionalização do setor
A nova lei determina que todas as despesas relacionadas ao consumo dentro da cadeia imobiliária — como reformas e serviços gerais — geram créditos tributários, que poderão ser abatidos do IVA devido. Com isso, organização e documentação das despesas passam a ser essenciais.
Ao mesmo tempo, entra em cena a nova legislação sobre Imposto de Renda.
Como fica o Imposto de Renda para locadores de temporada
Segundo Faidiga, existem duas situações:
1. Locador permanece como pessoa física
- Rendas abaixo de R$ 5 mil mensais ficam isentas (com redução para faixas superiores).
- O restante segue na alíquota de 27,5%, além do IBS/CBS quando houver enquadramento.
- Em alguns casos, pode haver efeito positivo sobre outras rendas antes não tributadas.
2. Locador atua como pessoa jurídica
Abrem-se duas possibilidades:
- Controlar a distribuição de lucros para reduzir impactos de retenção e do imposto mínimo.
- Ter mais de um sócio (como o cônjuge), o que pode distribuir melhor a renda e reduzir a carga individual.
O advogado dá um exemplo:
“Se uma pessoa ganha R$ 1,2 milhão ao ano, pagará R$ 120 mil de imposto de renda mínimo. Mas, se esse valor for dividido entre duas pessoas — R$ 600 mil para cada — nenhum dos dois pagará esse imposto. A holding funciona como um filtro de tributação.”
Linha do tempo — Aluguéis de curta duração e a reforma tributária
2024
- PLP 108/2024 é aprovado no Senado
Propõe equiparar o aluguel de curta duração (até 90 dias) aos serviços de hotelaria.
Mantém limites de renda para definir quem passa a pagar os novos tributos.
2025
- Lei Complementar 214/2025 regulamenta o novo IVA (IBS/CBS)
Define quem será contribuinte obrigatório:- Empresas que alugam imóveis.
- Pessoas físicas profissionalizadas (mais de 3 imóveis, renda anual acima de R$ 240 mil ou renda mensal acima de R$ 24 mil).
- Estudos indicam forte impacto tributário
Estimativas indicam carga de até 39% sobre a receita para locadores enquadrados — o dobro da média da hotelaria.
2026
- Começa a transição para profissionalização do setor
- Soma das rendas de curta temporada às demais rendas imobiliárias para enquadramento.
- Avaliação da migração para pessoa jurídica.
- Organização de notas e despesas para gerar créditos tributários.
- Reforma tributária entra em vigor
- Aluguéis de curta duração passam a ser tributados como hotelaria.
- Pequenos locadores seguem isentos enquanto estiverem abaixo do piso de renda anual.
- IBS/CBS incidem apenas para contribuintes enquadrados.
- Imposto de Renda começa a refletir novas regras
Dois cenários se consolidam:- Pessoa física:
- Isenção para rendas abaixo de R$ 5 mil/mês;
- Para rendimentos entre R$ 5 mil e R$ 7.350, há alíquotas menores ou descontos parciais;
- Alíquota de 27,5% acima disso + IVA quando aplicável.
- Pessoa jurídica:
- Possibilidade de controlar distribuição de lucros;
- Planejamento com mais de um sócio reduz carga individual;
- Holdings ganham relevância como ferramenta de mitigação tributária.
- Pessoa física:
A partir de 2026 e adiante
- Mercado passa por reorganização
- Tendência de concentração entre locadores mais estruturados.
- Propriedades ofertadas via plataformas digitais ficam mais rastreáveis e sujeitas à cobrança plena dos tributos.
- Preços ao consumidor podem subir, por repasse de custos ou redução da oferta.

