Veja o resumo da noticia

  • Reforma tributária impacta investidores imobiliários, com efeitos combinados das reformas do consumo e da renda exigindo análise caso a caso.
  • Construtoras se beneficiam de créditos de IBS/CBS, reduzindo custos na construção, enquanto locadores podem enfrentar aumento da carga tributária.
  • Novo sistema de créditos tributários entra em vigor em 2026, com apuração centralizada e mecanismos para garantir o pagamento efetivo.
  • Locações para não contribuintes tendem a encarecer devido à incidência de IBS/CBS, impactando aluguéis para pessoas físicas e empresas.
  • Reforma da renda elimina a neutralidade entre investimento imobiliário e financeiro, elevando a tributação sobre lucros distribuídos.
  • Fundos imobiliários ganham competitividade com a reforma, mantendo tributação favorecida e atraindo investidores.
  • Impactos variam conforme o segmento, exigindo monitoramento constante e planejamento estratégico por parte dos investidores.
Reforma tributária para investidores imobiliários: impactos na construção, locação e renda

Sob a ótica do investidor — seja diretamente em imóveis ou em produtos do mercado financeiro ligados ao setor —, a reforma tributária traz uma série de mudanças. Para deixar a situação um pouco mais complexa, também está em curso a reforma de renda, aprovada pelo Congresso em novembro, que vai impactar nos efeitos da reforma tributária.

O investidor deve ganhar em uma frente, mas perder em outra, o que vai exigir um estudo minucioso caso a caso, pois há efeitos positivos na construção, mas aumento de carga na locação e na renda de pessoas jurídicas.

Neste guia completo do Portas você vai entender de forma geral as mudanças que já estão definidas, o que ainda precisa ser regulamentado e saber o que é preciso ser feito para mitigar eventuais perdas com novas tributações.

Por que isso importa para o investidor?
A reforma tributária mexe em construção e locação. A reforma da renda mexe na tributação do lucro. O efeito final depende de como as duas se combinam no seu caso específico (PF, PJ ou FII).

Quem ganha e quem perde com as mudanças

GrupoImpacto provávelMotivo principal
Construtores e incorporadoresTendem a ganharCréditos de IBS/CBS reduzem o custo de construção (capex).
Locadores PF com poucos imóveisImpacto limitadoContinuam tributados pelo IR sobre ganho de capital e renda, sem entrar no IBS/CBS na maioria dos casos.
Locadores PF com 4+ imóveis / PJs de locaçãoTendem a perderPassam a ser alcançados por IBS/CBS e pela nova tributação sobre lucros.
Inquilinos não contribuintes (PF e Simples)Tendem a perderNão geram créditos e podem sofrer repasse de aumento de carga nos aluguéis.
Fundos imobiliários (FIIs)Tendem a ganharMantêm regime atual enquanto investidores tradicionais são mais pressionados.

Queda no custo de construção

Uma vantagem para os investidores é o sistema de créditos, implementado pela reforma tributária: parte do que for pago com imposto de materiais e serviços na construção do imóvel vai virar crédito para o construtor abater dos seus próprios impostos.

“Se hoje você olhar para qualquer parede, ali dentro está embutido ICMS, PIS, Cofins, ISS. Tudo isso se torna custo que não volta”, explica Ricardo Lacaz, sócio do escritório Lacaz Martins, Pereira Neto, Gurevich & Schoueri, professor do Instituto Brasileiro de Direito Tributário.

Por que o custo de produção tende a cair

  • Hoje, os tributos incidentes em cada etapa da obra viram custo definitivo.
  • No novo modelo, esses mesmos tributos passam a gerar créditos que podem ser compensados.
  • O resultado é um custo de construção potencialmente menor e espaço para maior rentabilidade ou preços mais competitivos.

Com a possibilidade de recuperar esses valores via créditos, o custo de construção tende a cair, abrindo espaço para maior rentabilidade da locação ou preços mais competitivos. Potencialmente, o custo de capex (custo de investimento) será menor do que o do imóvel construído no sistema anterior, em que se imobilizavam os tributos incidentes sobre esse imóvel.

Isso, do ponto de vista da reforma tributária (do consumo), é positivo, mas só se aplica a imóveis erguidos já dentro do novo sistema.

O novo sistema de créditos da reforma tributária começará a funcionar apenas em 2026, quando entram em operação o IBS e a CBS, novas figuras de tributação trazida com a reforma tributária — embora 2026 seja ano-teste, com apuração, mas ainda sem recolhimento efetivo.

Na prática, o contribuinte terá créditos gerados ao seu favor em cada compra de bens e serviços que fizer. Haverá uma conta de chegada. Ou seja, o credor poderá usar o que foi acumulado para abater, mensalmente, o que ele precisa pagar de imposto.

A apuração será centralizada e deve usar mecanismos como o split payment, em que o imposto vai direto ao Fisco assim que o gasto é feito, garantindo que o crédito só exista se o tributo tiver sido efetivamente pago na etapa anterior.

Embora o desenho geral esteja definido, ainda há incertezas importantes — especialmente sobre como serão usados os créditos acumulados do sistema atual, como créditos de PIS/Cofins já existentes, quais itens poderão gerar créditos e como serão implementados, na prática, os sistemas de compensação automática e rastreabilidade das notas fiscais.

Locações mais caras para não contribuintes

Principais pontos para quem investe em aluguel

  • Aluguéis para pessoas físicas e empresas do Simples tendem a sentir mais o impacto.
  • Locadores com quatro imóveis ou mais e renda anual de R$ 288 mil passam a pagar IBS/CBS.
  • Parte da nova carga pode ser repassada para o inquilino em forma de reajuste.

Se o investimento inicial para construir pode se beneficiar, a lógica se inverte na receita da locação — sobretudo quando o inquilino é pessoa física ou empresa não contribuinte do IBS/CBS –ambas categorias não poderão utilizar os créditos.

Locadores com quatro imóveis ou mais, que façam R$ 288 mil de renda anual (ou R$ 240 mil de renda no ano-exercício anterior), passarão a pagar imposto, o que atualmente não existe.

“Hoje, a carga tributária sobre locação é de cerca de 3,65%. No novo sistema, deve subir para perto de 8,8% a 9%. Para quem não gera crédito, isso significa custo maior e possível reajuste do aluguel”, estima Lacaz.

Para o especialista tributário, quem investe em lojas de shoppings optantes pelo Simples, por exemplo, tendem a sentir com mais força esse impacto.

Como atenuante ao potencial aumento de carga tributária, a reforma prevê redução de R$ 600 na base de tributação (o montante obtido com aluguel, para efeito de cálculo do imposto).

Rendas com aluguéis maiores — a partir de R$ 5 mil, apenas como referência — serão mais impactadas.

“Do lado das receitas, você tem duas vertentes. Se o inquilino for contribuinte, em tese, o impacto é neutro, 0 a 0, porque ele vai poder gerar crédito para abater o imposto. É vida que segue. Agora, se o inquilino for não contribuinte, você teria potencialmente o impacto, e essa conta pode ser dividida entre o empresário, que poderá assumir um custo maior de tributo, e o inquilino, que sofreria aumento parcial do valor da locação. Após 2033, você teria potencialmente um aumento de 5 pontos percentuais no custo da locação para não contribuintes”, afirma Lacaz.

Reforma da renda: quebra da neutralidade

A aprovação, pelo Congresso, da reforma de renda (PL 14.270), segundo Lacaz, vai em direção contrária ao texto da reforma tributária.

Os dois arcabouços legais, segundo a tese defendida pelo governo federal, visam melhorar a justiça tributária no Brasil.

Se a reforma tributária (consumo) oferece um quadro de incentivos e desincentivos, a reforma da renda — aprovada em novembro — é avaliada como “extremamente danosa” ao investimento imobiliário tradicional segundo o advogado Ricardo Lacaz. “Ela tira a neutralidade histórica do mercado de locação.”

Como era a neutralidade entre imóveis e mercado financeiro

Historicamente, empresas de locação (pessoa jurídica) eram tributadas em cerca de 14,53% sobre o resultado, muito próximo dos 15% cobrados sobre aplicações financeiras, garantindo neutralidade entre investir em imóveis ou em renda fixa.

Com a nova legislação, essa neutralidade desaparece, afirma Lacaz. “A carga sobe até 10 pontos percentuais para quem recebe mais de R$ 50 mil por mês em lucros distribuídos — perfil típico de investidores com vários imóveis locados via empresa.”

Assim, pelos cálculos do tributarista, a carga efetiva chega a cerca de 25%. “O investidor vai comparar: pagar 15% no mercado financeiro ou 25% na locação. Vai escolher onde o retorno é maior e mais simples”, diz Lacaz.

A tendência, diz o especialista, é que pode ocorrer uma queda no investimento direto em imóveis, com reflexos sobre emprego e sobre a oferta de galpões, escritórios, centros logísticos e demais estruturas essenciais a empresas, que são majoritariamente construídas por investidores privados.

Fundos imobiliários ganham força com mudanças tributárias

Por que FIIs tendem a ganhar competitividade

  • Mantêm a tributação em 15% para certas operações, sem as mesmas distorções da reforma da renda para PJs tradicionais.
  • Tornam-se alternativa natural para investidores que buscam renda imobiliária com gestão profissional.

Enquanto a reforma da renda tende a gerar um impacto negativo para o investidor tradicional, os fundos imobiliários mantêm vantagens tributárias comparativas importantes e devem se tornar beneficiários do processo – ao serem tributados além do que são hoje, os 15% atuais se mantêm.

A migração de capital para veículos estruturados, reduzindo a participação dos investidores clássicos que, historicamente, erguiam prédios, centros logísticos e empreendimentos de grande porte, é uma tendência real, segundo especialistas.

“O fundo imobiliário terá uma vantagem competitiva enorme. Consegue suportar muito mais custo tributário que uma empresa tradicional. Fica difícil competir”, afirma Lacaz.

Sem receita de bolo: impactos variam conforme o segmento

O conjunto das duas reformas produz um cenário multifacetado: redução de capex para novos projetos, pressão de preços sobre locações a não contribuintes (incluindo lojistas de shopping centers), eventual migração do capital para fundos e mudanças no comportamento de investidores.

“O dinheiro é inteligente. Ele vai para onde o retorno é maior e o risco é menor. Se a tributação pesa mais na locação, esse capital migra para outras estruturas. E isso afeta toda a cadeia”, argumenta Lacaz.

O resultado, portanto, não é linear — e não existe uma receita de bolo para prever seus impactos. Cada segmento será afetado de forma distinta, dependendo do tipo de imóvel, do perfil do inquilino e da forma como o investidor está estruturado.

Checklist: o que o investidor deve monitorar

  • Se a carteira está em PF, PJ ou FII.
  • Qual a proporção de inquilinos contribuintes x não contribuintes.
  • Como a reforma afeta novos projetos de construção (créditos e capex).
  • Se há necessidade de reestruturação societária no médio prazo.

Os especialistas alertam que os investidores precisam começar a monitorar a situação para se prepararem adequadamente para as mudanças. Como as mudanças não serão drásticas em um intervalo curto de tempo, planejamento passa a ser a palavra de ordem.

Linha do tempo dos impactos para investidores imobiliários

2025 — Preparação e regulamentação

  • Publicação das leis complementares e definições finais de regras.
  • Investidores começam a revisar estratégias, especialmente para operações de compra e venda com fins comerciais.
  • Mercados passam a precificar eventuais mudanças na não cumulatividade futura.

2026 — Ano teste (sem impacto de caixa)

  • CBS/IBS são calculados, mas não pagos.
  • Contribuintes seguem recolhendo PIS/Cofins + ICMS/ISS normalmente.
  • Investidores podem simular a carga futura em incorporação, compra e venda, locação comercial e fundos imobiliários (FIIs ainda não impactados).

2027 — Início da transição com impacto real

  • Começa a transição para o novo modelo.
  • Redução gradual de PIS/Cofins.
  • Início da cobrança parcialmente efetiva da CBS.
  • Operações passam a envolver as diferenças de créditos e débitos.
  • Custos de construção começam a refletir o sistema novo.
  • Ganhos de eficiência podem surgir em projetos com cadeias longas.

2028 a 2032 — Transição contínua e desoneração parcial

  • Mistura entre regime antigo e novo.
  • Expectativa de maiores impactos e maior previsibilidade tributária para projetos longos.
  • Melhor recuperação de créditos na construção civil.
  • Ajustes no fluxo de caixa de incorporadoras.
  • Potencial impacto nos preços finais — variação depende da alíquota padrão.

2033 — Fim da transição e entrada total do novo sistema

  • Extinção completa de PIS/Cofins, ICMS e ISS.
  • Vigência plena de CBS + IBS.
  • Efeitos consolidados no setor imobiliário.
  • Tributação uniforme em obras e serviços ligados ao setor.
  • Sistema de construção e investimentos totalmente não cumulativo, melhorando créditos de construção.
  • Eventual maior carga na compra e venda dependendo da alíquota padrão final.
  • FIIs permanecem com isenções atuais (salvo mudança futura).
Eduardo Geraque
Eduardo Geraque

Repórter colaborador

Eduardo Geraque é jornalista com mais de três décadas de experiência em coberturas de economia, cidades, meio ambiente, ciência e esportes. Atuou por 12 anos na Folha de S.Paulo, onde foi repórter de cidades, meio ambiente e esportes, participando de grandes reportagens sobre temas como crise hídrica, desastres ambientais e eventos esportivos internacionais — incluindo a Copa do Mundo da Rússia e a Olimpíada do Rio. Mestre em Oceanografia e doutor em Jornalismo Ambiental, é colaborador do Portas, Estadão, Valor Econômico e InfoAmazonia — com este último, venceu o Prêmio Rei da Espanha pelo projeto Engolindo Fumaça.

Eduardo Geraque é jornalista com mais de três décadas de experiência em coberturas de economia, cidades, meio ambiente, ciência e esportes. Atuou por 12 anos na Folha de S.Paulo, onde foi repórter de cidades, meio ambiente e esportes, participando de grandes reportagens sobre temas como crise hídrica, desastres ambientais e eventos esportivos internacionais — incluindo a Copa do Mundo da Rússia e a Olimpíada do Rio. Mestre em Oceanografia e doutor em Jornalismo Ambiental, é colaborador do Portas, Estadão, Valor Econômico e InfoAmazonia — com este último, venceu o Prêmio Rei da Espanha pelo projeto Engolindo Fumaça.