O que as imobiliárias precisam fazer ainda em 2025 para reforma tributária

A reforma tributária, aprovada no Congresso de forma definitiva em setembro, determinou que o ano de 2026 será mais voltado a testes no mercado imobiliário. “Mas é preciso começar a trabalhar agora”, afirma a advogada Raquel Queiroz Braga.

Isso porque os proprietários com imóveis alugados (principais afetados no mercado de locação) precisarão ser bem orientados, e a imobiliária será seu principal ponto de apoio.

O principal, segundo a especialista em reforma tributária no mercado de locação, é que as imobiliárias mapeiem com atenção suas carteiras de imóveis. “Ao identificar quais clientes proprietários pessoas físicas se enquadram como contribuintes, já é possível orientá-los sobre as obrigações que terão.”

Em 2026, não está previsto o recolhimento de tributos devido à reforma, mas haverá penalidades para quem não utilizar o sistema em até 60 dias depois de ser notificado. “O ano que vem será um período de ajustes de sistemas, adaptações contábeis e revisão de processos”, afirma Raquel, que conduziu na Loft em outubro uma imersão sobre o impacto na reforma no mercado de locação.

Do ponto de vista geral, a reforma tributária representa uma das mudanças mais amplas e estruturais já realizadas no sistema de impostos do Brasil. Seu objetivo central é simplificar e unificar tributos sobre o consumo, substituindo uma série de impostos federais, estaduais e municipais por um modelo mais transparente, com regras uniformes em todo o país. A transição busca reduzir a complexidade do atual sistema, que gera insegurança jurídica e altos custos de conformidade para empresas de todos os setores.

5 coisas que você precisa saber sobre a reforma tributária e o aluguel

  1. 2026 será um ano de testes. Ainda não haverá cobrança do novo imposto, mas o envio de informações será obrigatório. Quem não usar o sistema após notificação pode ser multado.
  2. Locadores com 4 imóveis ou mais podem se tornar contribuintes. Isso ocorre se ultrapassarem R$ 240 mil no ano (regra do retrovisor) ou R$ 24 mil em um mês (regra mensal).
  3. A imobiliária terá papel central na orientação. Contratos precisarão separar valor do aluguel e taxa de administração para evitar tributação indevida.
  4. O CIB (Cadastro Imobiliário Brasileiro) aumenta a rastreabilidade. Será necessário conhecer todo o estoque de imóveis do locador para evitar enquadramento incorreto.
  5. Créditos tributários podem reduzir o imposto, mas exigem formalização. Imobiliárias e locadores precisarão emitir notas, registrar despesas e atualizar sistemas.

Cuidados essenciais para gestão tributária

Na visão da advogada Raquel, as imobiliárias precisam correr para incorporar o novo conjunto de regras às suas rotinas de trabalho –sob pena de não conseguir atender todas as demandas que vão surgir por parte dos clientes. “Dessa forma, as imobiliárias, os locadores e os locatários ficarão protegidos de riscos fiscais e operacionais significativos.”

Como o novo sistema terá maior rastreabilidade – inclusive com a implementação do CIB (Cadastro Imobiliário Brasileiro, que dará uma espécie de CPF a cada imóvel) – um dos cuidados imediatos é com carteiras pulverizadas de imóveis. As imobiliárias, ao se comunicar com os proprietários, precisarão conhecer todo o estoque de imóveis de seus clientes – muitos utilizam várias imobiliárias – para fazer o correto enquadramento de cada locador, quando necessário. Os contratos de administração devem detalhar a autorização do locador para declaração e pagamento de impostos, garantindo que qualquer alteração na condição patrimonial seja comunicada à imobiliária.

Os advogados Raquel Queiroz Braga (em pé), Henrique Anders (sentado, à esq.), Lívia Suzana e Luís Fábio Mandina, na imersão com imobiliárias na Loft – Imagem: divulgação

“O dever de informação da imobiliária inclui orientar o locador sobre tributação, cobranças corretas e responsabilidades legais. É preciso dar as ferramentas necessárias para os proprietários e também fazer com que eles realizem uma autoavaliação de sua situação em termos de renda e número de imóveis”, explica a advogada tributarista Lívia Suzana, que também participou da imersão na Loft.

Uma das sugestões práticas das especialistas é a criação de uma espécie de “ficha do locador”, que deve ser encarada como um pré-contrato essencial, no qual o proprietário manifesta sua intenção de entregar o imóvel para administração, declara sua situação patrimonial e reconhece suas obrigações tributárias. “Esse documento tende a funcionar como a base de todo o processo administrativo e tributário da imobiliária, garantindo que todas as informações relevantes sejam registradas desde o início da relação, criando transparência e segurança para ambas as partes”, afirma Raquel.

A ação mitiga a dificuldade para o caso do proprietário que possui imóveis em diferentes imobiliárias –o que dificulta a identificação dos gatilhos para pagamento do IVA.

Além disso, a ficha do locador deve ser atualizada sempre que houver alterações patrimoniais, assegurando que a imobiliária esteja permanentemente informada e possa cumprir corretamente suas obrigações legais e tributárias. Ao refletir essas informações no contrato de administração, a imobiliária se protege juridicamente, minimiza riscos de prejuízo ao locador e estabelece uma operação mais segura, organizada e alinhada às exigências tributárias.

Sem receita de bolo: adaptação e planejamento

Como várias nuances da nova reforma ainda necessitam de regulamentação, muitas perguntas permanecem sem respostas. Por isso, a orientação dos especialistas que participaram da imersão na Loft – além de Raquel e Lívia, estiveram presentes os advogados Henrique Anders e Luís Fábio Mandina – é que assuntos mais delicados e particulares sejam analisados por profissionais especializados.

As linhas gerais já definidas indicam mudanças que precisarão ser feitas no dia a dia das imobiliárias. Como os novos impostos surgem a partir do fato gerador representado pelo pagamento do aluguel, uma providência interessante é que os valores sejam corretamente especificados. Ou seja, a taxa de administração precisa estar separada do valor do aluguel, para que a alíquota (ainda não definida) não recaia sobre o total. A tendência é que pacotes de aluguel, que englobam taxas como condomínio e IPTU, caiam em desuso, já que esses valores passarão a ser computados para os gatilhos para pagamento de imposto.

De acordo com Mandina, será importante que os contratos de locação sejam registrados em cartório ou em plataforma digital certificada, com assinaturas reconhecidas e testemunhas, garantindo validade fiscal. “Com o registro desses documentos na matrícula do imóvel ou na Receita Federal, ficará mais simples manter o regime tributário escolhido”, diz.

Até janeiro de 2026, cada caso deverá ser analisado individualmente para definir o regime tributário a ser usado nos contratos em vigor. Os que optarem por alíquotas menores e permanecerem no sistema antigo não poderão gerar créditos tributários, outra novidade da lei. As imobiliárias, para se adaptarem, terão que organizar sistemas que conversem de forma eficiente com a contabilidade de seus clientes. “Não tem para onde correr. Muitas vezes, os melhores clientes serão os mais afetados pela reforma”, explica Raquel.

Créditos tributários e impacto no preço do aluguel

Para proprietários pessoa jurídica, a questão dos créditos tributários é um dos pontos centrais da reforma. Despesas com insumos, produtos e serviços ligados à atividade imobiliária – como no caso de um consultório dentário alugado que tem custos com produtos de limpeza e itens essenciais ao funcionamento – gerarão créditos que podem ser compensados com o tributo devido, incentivando a formalização das operações e a emissão de notas fiscais, explica Lívia. “O inquilino poderá funcionar como um fiscalizador”, afirma a advogada.

A gestão desses créditos exigirá sistemas próprios ou aperfeiçoados por parte das imobiliárias, além de acompanhamento rigoroso de pagamentos, uma vez que o crédito só nasce com o pagamento efetivo do tributo. “Será essencial contratar bons profissionais e sistemas: a Receita Federal prometeu fornecer interfaces básicas gratuitas, mas as empresas deverão desenvolver sistemas próprios com mais funcionalidades”, alerta a advogada.

Para contratos de locação, recomenda-se cláusula específica destacando o valor líquido do aluguel e o tributo, preservando a transparência e evitando repasses indevidos. Locadores pessoa jurídica terão vantagem adicional ao poder compensar créditos, enquanto pessoas físicas terão limitações, tornando realmente essencial análise individualizada sobre a migração para o novo regime.

Ao instituir a CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços) com possibilidade de compensação de créditos, a reforma também tende a interferir na manutenção dos imóveis. Por isso, será necessária maior formalização das operações, incluindo cadastro de prestadores de serviço, emissão frequente de notas fiscais e revisão sistemática de contratos e sistemas internos, garantindo transparência e segurança fiscal.

“Embora essas medidas possam reduzir margens de lucro, elas permitem uma gestão mais eficiente dos créditos tributários e reduzem os riscos associados à manutenção de imóveis, que historicamente têm sido fonte de inconsistências fiscais quando valores são recebidos sem execução adequada das obras”, explica Raquel.

No que se refere ao preço do aluguel, a expectativa é que a reforma influencie diretamente a precificação técnica. Enquanto o mercado de oferta e demanda continuará relevante, a carga tributária passa a ser um elemento central na composição dos valores, especialmente para locadores pessoa jurídica, que podem compensar créditos, diferentemente de pessoas físicas. Dessa forma, o CBS não apenas orienta decisões sobre manter o patrimônio como pessoa física ou migrar para pessoa jurídica, mas também aumenta a transparência para locadores e locatários, tornando a tributação um componente explícito do aluguel e impactando a negociação e a formação de preços no mercado imobiliário.

Impactos diretos nas imobiliárias e perspectivas

Quando o foco se volta para as contas das imobiliárias, a reforma tem impacto direto, especialmente na forma de tributação sobre serviços e operações. A criação do Imposto sobre Valor Adicionado (IVA), que unifica tributos como PIS, Cofins, ISS e ICMS, deve alterar a carga tributária incidente sobre atividades de intermediação, locação e administração de imóveis. Além disso, a simplificação das regras tende a reduzir o tempo e o custo gastos com obrigações acessórias e diminuir a margem para interpretações divergentes da legislação, trazendo mais segurança para os negócios.

No período de transição, as possíveis mudanças nas alíquotas exigem atenção e planejamento das empresas do setor. Será essencial acompanhar como estados e municípios irão regulamentar os novos tributos e como as alíquotas efetivas afetarão cada tipo de operação imobiliária. Em resumo, a reforma tributária traz desafios de adaptação no curto prazo, mas representa uma oportunidade de longo prazo para tornar o ambiente de negócios mais previsível, competitivo e favorável ao crescimento sustentável do mercado imobiliário.

Eduardo Geraque
Eduardo Geraque

Repórter colaborador

Eduardo Geraque é jornalista com mais de três décadas de experiência em coberturas de economia, cidades, meio ambiente, ciência e esportes. Atuou por 12 anos na Folha de S.Paulo, onde foi repórter de cidades, meio ambiente e esportes, participando de grandes reportagens sobre temas como crise hídrica, desastres ambientais e eventos esportivos internacionais — incluindo a Copa do Mundo da Rússia e a Olimpíada do Rio. Mestre em Oceanografia e doutor em Jornalismo Ambiental, é colaborador do Portas, Estadão, Valor Econômico e InfoAmazonia — com este último, venceu o Prêmio Rei da Espanha pelo projeto Engolindo Fumaça.

Eduardo Geraque é jornalista com mais de três décadas de experiência em coberturas de economia, cidades, meio ambiente, ciência e esportes. Atuou por 12 anos na Folha de S.Paulo, onde foi repórter de cidades, meio ambiente e esportes, participando de grandes reportagens sobre temas como crise hídrica, desastres ambientais e eventos esportivos internacionais — incluindo a Copa do Mundo da Rússia e a Olimpíada do Rio. Mestre em Oceanografia e doutor em Jornalismo Ambiental, é colaborador do Portas, Estadão, Valor Econômico e InfoAmazonia — com este último, venceu o Prêmio Rei da Espanha pelo projeto Engolindo Fumaça.