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Análise & Opinião

Inteligência Artificial no mercado imobiliário: como criar uma cultura de IA nas imobiliárias

Como a cultura de IA nas imobiliárias amplia produtividade, independência e gestão inteligente no mercado imobiliário

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Imagem: iStock
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Quando os smartphones chegaram, já representava uma revolução acessar e-mail e mensagens numa tela sensível ao toque. O salto veio depois, quando a combinação de hardware, conectividade e uma “cultura de apps” permitiu que alguns “startupeiros” criassem (e usassem) serviços inteiramente novos — de transporte a música, de alimentação a finanças, tais como Airbnb, Uber, iFood, internet banking etc.

A inteligência artificial vive momento semelhante no mercado imobiliário. A primeira onda — chatbots 24/7, resumos automáticos, respostas mais rápidas — é útil, mas ainda trivial perto do que ainda está por vir. Então, vamos esperar. O que importa agora é estabelecer cultura de IA: práticas, linguagem e rotinas que tornem a IA uma ferramenta do trabalho cotidiano de todos, e não um privilégio de desenvolvedores ou de uma elite técnica.

Essa mudança de cultura traz uma consequência estratégica: mais independência para as empresas. Ideias que antes dependiam de projetos caros ou fornecedores raros passam a ser prototipadas por quem está enfrentando o problema no balcão, no jurídico, na captação ou na diretoria.

O foco muda de “comprar tecnologia” para resolver problemas com tecnologia.

O que essa cultura muda na gestão

Nas operações imobiliárias, o tempo é o recurso que define margem: rapidez para qualificar leads, organizar visitas, montar propostas e para corrigir contratos.

A IA, incorporada ao dia a dia, atua sobretudo como amplificador de tempo. Vemos equipes que deixam de reescrever as mesmas mensagens e transformam respostas boas em modelos; corretores que chegam às visitas com checklists mais inteligentes; gestores que recebem relatórios que contam uma história (não apenas despejam planilhas).

Não se trata de automatizar pessoas, mas de aumentar a produtividade individual e a consistência entre equipes.

Como reconhecer uma cultura de IA

Há alguns indicativos práticos:

Primeiro: os problemas são nomeados antes das ferramentas. Em vez de “precisamos de IA no site”, a conversa passa a ser “estamos perdendo X% de visitas por falta de follow-up no D+2; como a IA ajuda a garantir a próxima ação?”.

Segundo: o conhecimento é cumulativo: a empresa mantém uma biblioteca viva de modelos de mensagens, checklists e comparativos, com versão e responsável.

Terceiro: existe revisão humana onde importa (jurídico, financeiro, LGPD), e critérios objetivos reduzem vieses na triagem de clientes.

Por fim: a direção estabelece métricas simples, tais como velocidade de resposta, qualidade de qualificação, conversão por etapa, retrabalho em contratos, para separar evidência de entusiasmo.

Métricas que se provam no antes/depois

Empresas que incorporam IA como rotina operacional, e não como projeto isolado, desenvolvem uma cultura de medição contínua focada em indicadores fundamentais: responsividade no atendimento, qualificação consistente de leads, fluidez no funil de vendas, satisfação do cliente e redução de retrabalho.

Esses indicadores revelam rapidamente o impacto real das mudanças implementadas. Quando processos como triagem e follow-up se tornam sistemáticos, observa-se melhoria significativa em agendamentos; quando o pós-visita é padronizado com qualidade, há aumento na geração de propostas; e quando revisões são feitas de forma estruturada, reduz-se substancialmente o retrabalho jurídico.

O valor está menos nos números absolutos e mais na capacidade de estabelecer relações causais claras entre mudanças processuais e resultados mensuráveis, criando um ciclo de melhoria contínua baseado em evidências.

Responsabilidade e governança sem paralisia

De maneira geral, a adoção de inteligência artificial precisa lidar com três frentes:

Privacidade e LGPD: dados pessoais e sensíveis devem permanecer em ambientes com contrato, DPA e logs adequados; material de clientes não deve ser usado para treinar modelos públicos.

Qualidade de informação: IA erra! Por isso, é indispensável uma revisão humana nos pontos críticos e uma política clara de fontes e versões.

Vieses: critérios explícitos de qualificação evitam decisões baseadas em suposições sobre renda, bairro ou perfil — tudo deve ser auditável.

Obstáculos reais e para onde isso pode ir

Inúmeras práticas do dia a dia das imobiliárias podem ser otimizadas com IA — do atendimento à operação. A maior parte das aplicações ainda será descoberta na prática: a criatividade de proprietários e colaboradores transformará os pioneiros em co-autores desses usos, como ocorreu com os primeiros empreendedores de apps para smartphones.

Se olharmos para o trabalho do corretor, apenas como exemplo de aplicação, temos roteiros de visita que deixam de ser “checklists genéricos” para se tornarem guias adaptados ao perfil do cliente (investidor, primeira compra, família em mudança de bairro).

Na imobiliária, a IA, treinada com histórico de objeções da própria imobiliária, dá suporte ao argumento e ajuda a preparar melhor a proposta — não com frases prontas, mas com estrutura e ordem, com disponibilidade 24/7.

No marketing e na captação, variações de anúncio centradas em benefícios do bairro (e não só em atributos físicos do imóvel) tendem a elevar a taxa de clique. Já na captação, comunicações ao proprietário com comparativos de mercado — gerados a partir de dados internos e públicos — ajudam a alinhar expectativa de preço sem conflito.

Se a primeira onda foi “assistência” (escrever, resumir, classificar), a próxima é a de aplicações pensadas por quem opera o negócio.

Em locação, veremos detecção preditiva de vacância combinando conversas, histórico e contexto urbano, com ações pré-definidas para retenção; em vendas, simulações personalizadas de financiamento e custos de posse integradas à proposta; na gestão, painéis que contam a história do mês e sugerem prioridades de ação.

Nada disso exige esperar por “a solução perfeita”: exige que as equipes experimentem e que a direção legitime o aprendizado.

Mas estamos apenas no começo.

Conclusão

O setor imobiliário tende a tratar tecnologia como substituição ou como aquisição. Com Inteligência Artificial, a vantagem competitiva virá de outro lugar: a capacidade de transformar a inteligência do time em processos replicáveis, melhorando a execução e potencializando talentos das empresas.

A segunda revolução industrial eliminou, sim, o trabalho de carroceiros, mas criou um bem mais salubre: o de maquinista.

A primeira onda da IA já mostrou que há ganho fácil. A segunda, mais importante, depende de cada imobiliária assumir que IA é uma ferramenta para todos e decidir se quando irá começar a trabalhar com “maquinistas”.